Fósseis de uma serpente que talvez devorasse filhote de dinossauros há 70 milhões de anos podem ser a pista que faltava para entender como as cobras adquiriram a capacidade de deglutir presas proporcionalmente muito grandes de uma só vez.
Os primeiros passos do processo parecem ter envolvido pequenas modificações na parte traseira do crânio, os quais também ajudariam a entender como a linhagem das serpentes se separou das dos demais répteis.
A espécie-chave de um novo estudo sobre o tema é a Sanajeh indicus, encontrada, como sugere seu nome científico, no oeste da Índia. O animal foi descrito originalmente em 2010, mas um novo exemplar fossilizado preserva estruturas cranianas que trazem informações importantes sobre as origens da chamada macrostomia das serpentes.
O termo, derivado de palavras gregas com o significado literal de “boca grande”, refere-se não só à abertura bucal proporcionalmente enorme de muitos desses bichos como também a movimentos especializados que os ajudam a engolir vítimas de grande porte.
Esses movimentos peculiares da macrostomia dependem de uma série de especializações na estrutura do crânio dos répteis, incluindo a região posterior craniana, o céu da boca (ou palato) e a junção entre o focinho e o resto da boca. Nem todas as cobras modernas são capazes desse tipo de feito, mas as mais conhecidas do público, como jiboias, cascavéis e pítons, conseguem realizá-lo.
O novo trabalho sobre a Sanajeh, que inclui ainda uma ampla análise comparativa envolvendo outras serpentes extintas e modernas, está no periódico especializado Zoological Journal of the Linnean Society. O trabalho é assinado por uma dupla de brasileiros —Hussam Zaher, do Museu de Zoologia da USP, e Felipe Grazziotin, do Instituto Butantan— , junto com Jeffrey Mantilla, da Universidade de Michigan (EUA), e Dhananjay Mohabey, da Universidade de Nagpur, na Índia.
Zaher, um dos principais especialistas nas fases iniciais da evolução das serpentes durante a Era dos Dinossauros, conta que muito provavelmente a espécie indiana ainda tinha patas traseiras pequenas, mas funcionais, embora esses pedaços do esqueleto do animal não tenham se fossilizado.
As patas, que deixam claro a relação de parentesco entre esses animais e os antigos lagartos dos quais descendem, estão presentes em outras cobras primitivas, como a Najash rionegrina, que Zaher descreveu junto com colegas da Argentina. Os fósseis da Sanajeh foram achados em ninhos de dinossauros saurópodes —gigantes quadrúpedes, herbívoros e de pescoço longo. Como os filhotes eram minúsculos se comparados a seus pais, faz sentido imaginar que a Sanajeh os predasse.
O pesquisador da USP explica que os dados sobre as origens da macrostomia são relevantes para uma discussão mais ampla sobre o surgimento das serpentes como um todo. Trata-se de um debate que basicamente opõe o mar à terra firme –de um lado, alguns pesquisadores defendem que as cobras descendem de um grupo de répteis aquáticos, os mosassauros (lagartos marinhos), enquanto outros cientistas, entre os quais ele se inclui, argumentam que uma origem terrestre e fossorial (ou seja, vivendo em tocas no solo) é o cenário mais condizente.
Acontece que a macrostomia chegou a ser usada como um dos trunfos daqueles que defendem a origem aquática das serpentes, uma vez que os mosassauros também tinham essa característica. Algumas espécies de cobras com patas da Era dos Dinossauros, que tinham hábitos marinhos e apresentavam macrostomia, também eram citadas como argumento em favor dessa ideia.
Os novos dados sobre a Sanajeh, no entanto, contrariam essa hipótese ao mostrar que as primeiras modificações cranianas que acabariam possibilitando o surgimento da macrostomia em serpentes não seguiram os mesmos passos nos mosassauros. Teria sido, portanto, um processo de evolução convergente —grosso modo, tal como o voo das aves e dos morcegos, que produziu resultados parecidos sem que um grupo descendesse do outro.
Em serpentes de anatomia muito primitiva, como a espécie indiana, esses primeiros passos envolveram alterações que produziram uma caixa craniana mais fechada. “Além disso, a Sanajeh e outras serpentes semelhantes possuem uma mandíbula com uma articulação interna e já perderam a conexão fixa que existia entre pré-maxilar [o osso da frente na parte de cima da boca, mais ou menos abaixo do nariz em humanos] e maxilar”, diz Zaher. “Basicamente, são elementos intermediários entre cobras e lagartos.”
Essas “dobradiças” bucais podem ter dado um primeiro empurrãozinho na capacidade de encarar presas muito grandes. Mas ainda faltavam dois elementos importantes para a macrostomia propriamente dita. Um deles é a mobilidade da região palatina (o céu da boca). “Nesse ponto, a Sanajeh tem características de lagarto”, destaca o pesquisador. A outra é a junção móvel entre o focinho e o resto do crânio das serpentes. É com a ajuda dessas diversas áreas com mobilidade que a maioria das espécies atuais consegue empurrar presas proporcionalmente grandes goela adentro.
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